O que é TDPM?
Com sintomas mais acentuados que a TPM comum, o Transtorno Disfórico Pré-Menstrual pode causar episódios de autolesão e até mesmo suicídio
Todo mundo conhece alguma mulher que sofre com os sintomas da tensão pré-menstrual, a famosa TPM. Ela chega uma vez por mês, sempre antes da menstruação e traz consigo diversos sintomas desagradáveis como dor de cabeça, irritação, choro fácil, perda ou excesso de apetite (principalmente para doces) entre outros. Um estudo feito pela universidade de Campinas aponta o Brasil como país da TPM: oito a cada dez brasileiras sofrem com o mau, o que resulta em 41 milhões de mulheres, contrariando os 35% da média mundial.
Mas existem casos em que os sintomas extrapolam os da TPM comum, onde a mulher fica incapacitada de desenvolver as atividades do dia-a-dia. Estudos epidemiológicos apontados pela Revista de Psiquiatria da USP indicam que entre 2% a 8% das mulheres em idade reprodutiva padecem por sintomas severos o suficiente para desequilibrar a vida social, familiar e profissional durante uma a duas semanas por mês antes da menstruação. Elas sofrem de TDPM, o Transtorno Disfórico Pré-Menstrual.
A Dra. Kelly Alessandra, ginecologista e obstetra afirma que a diferença entre a TPM e a TDPM é que os sintomas emocionais são muito mais intensos que os sintomas físicos: "essas mulheres podem apresentar alterações de humor como tristeza, choro fácil, alteração da capacidade de concentração e de sentir prazer em coisas simples do dia a dia, se tornam mais ansiosas, medrosas, inseguras, maior apetite para doces e carboidratos, problemas com o sono (ou muito sono ou insônia), além de irritabilidade e agressividade".
O que difere no diagnóstico da TDPM é que ele é feito por um psiquiatra, não um ginecologista. São levados em conta os sintomas emocionais e a relação com o período menstrual, pois todas as queixas e mal-estar tendem a sumir assim que a menstruação chega. É o caso de Renata Carvalho, 32 anos: "Descobri a TDPM tem seis meses, mas eu sempre soube que a minha TPM era diferente que a das minhas amigas. Eu tenho todos os sintomas piores antes da menstruação e quando menstruo eu fico muito bem, tenho ataques de felicidade. Sempre soube que era diferente, mas como não tinha acesso à internet quando eu era mais nova, não tinha onde pesquisar. Depois com o acesso eu pesquisei e descobri. Nunca tinha ido à psiquiatra, quando pude passar ela diagnosticou para mim".
Ela afirma que nunca procurou uma ginecologista pois já tratava alguns transtornos psiquiátricos e não sabia da relação com o ciclo menstrual. "Sempre ficava assim quinze dias antes da menstruação, mas não sabia que meu transtorno de pânico ou minha ansiedade eram relacionados à TDPM".
Para Renata, lidar com a mudança de humor é difícil desde cedo: "A TDPM sempre me afetou porque eu achava que tinha baixa autoestima. Na época da escola tinha fases em que eu achava que ninguém gostava de mim, que eu era feia, e descobri que não tinha nada a ver. Quando fiquei mais velha os problemas psiquiátricos que eu já tinha ficavam gigantes quando estava perto de descer para mim. Chegava na TDPM com pensamentos suicidas. Complica muito porque são quinze dias por mês, é metade do ano que eu passo assim. A gente desiste da vida".
Os remédios não fizeram grande diferença em seus sintomas, ressalta. "Eu já tomava fluoxetina para o TAG (Transtorno de Ansiedade Generalizada), então a psiquiatra falou que era o mesmo remédio para tratar a TDPM. Não vi diferença nenhuma, mas senti diferença por fazer exercícios físicos e cuidar da alimentação. Com a medicação não tive resultados, tanto que estou tirando aos poucos. Vou me cuidar somente com o natural mesmo, que foi onde eu vi melhora".
Nem sempre é fácil diagnosticar o Transtorno Disfórico Pré-Menstrual. São muitas possibilidades de diagnóstico, sendo facilmente confundido com bipolaridade ou depressão. Letícia Nunes de 27 anos descobriu a TPM recentemente, cerca de oito meses atrás, mas ainda não sabe ao certo se é realmente apenas a TPM que a afeta. "O meu diagnóstico ainda está sendo estudado, não foi dado logo de cara como uma TDPM. Meu ginecologista diz que sim, outros médicos dizem que não. Eu estou anotando em um caderno todos os meses, quinze dias antes da menstruação, as mudanças de temperamento, dor de cabeça, vômitos, irritabilidade. Meu ginecologista entrou com a fluoxetina para fazer o tratamento da TDPM, mas ainda não é um diagnóstico certo".
Para ter certeza de que a mulher sofre com a TDPM são necessários alguns tipos de avaliação médica em conjunto. De acordo com a Conferência Americana de Psiquiatria de 1997, devem ser feitas avaliações psiquiátricas, clínicas, laboratoriais, checagem de histórico familiar, uso de medicamentos e uma avaliação nutricional. Somente após essas análises o diagnóstico pode ser dado sem nenhuma dúvida.
O tratamento mais comum é feito com antidepressivos, que podem ser receitados tanto pelo psiquiatra quanto pelo ginecologista. Glaucia Garcia de 31 anos fez o uso da Sertralina para tratar o transtorno, que também não foi diagnosticado com 100% de certeza. "Eu descobri a TDPM em um domingo muito bonito, que eu simplesmente fiquei de cama, com vontade de morrer, de me matar. Procurei a ginecologista, fizemos todos os exames de sangue e neles não constava nada que fosse hormonal. Então eu anotei tudo o que eu sentia em um papel cerca de dez dias antes de menstruar, e ela me receitou antidepressivos, no meu caso Sertralina, mas não disse o meu diagnóstico. Foi pesquisando na internet que eu descobri que TDPM existe. Tomei o remédio por dois meses, me fez bem, mas depois piorei e fiquei mais depressiva, então por conta própria parei de tomar. Não tomo mais remédios mas continuo com todos os sintomas, parece que a cada mês surge um novo. Isso afeta a minha vida, tem vezes que não venho trabalhar, não tenho condições".
Nickolas Caruí, recém formado em medicina pela Universidade de São Paulo (USP), ressalta os perigos que a TDPM pode causar na vida das mulheres: "Além do humor extremamente depressivo, crises de ansiedade, alterações no sono e alimentação, há o risco aumentado de suicídio, o que gera alterações graves em diversos âmbitos da vida da mulher, tanto no profissional quanto no social".
Adrienne Vilar, 29 anos, outra vítima da TDPM conta um pouco sobre a descoberta do transtorno e como sua vida mudou drasticamente: "Descobri a TDPM tem mais ou menos uns oito meses. Descobri porque já tinha tido alguns quadros de depressão, mas percebi que não eram os mesmos sintomas que eu tive antes. Eu estava oscilando muito de humor em um espaço curto de tempo. Lendo a respeito que eu vi que estava com todos os sintomas da TDPM. Não passei em nenhum médico que me desse esse diagnóstico, cheguei na psiquiatra falando que eu estava com a TDPM, ela fez algumas perguntas e me passou o medicamento, no meu caso a sertralina que melhorou muito a minha vida. O transtorno afetou a minha rotina em casa e principalmente profissionalmente: tinha dias que eu chegava no trabalho chorando, aí no meio do expediente eu já melhorava. Em casa também com o marido, com o meu filho, tinha dias em que me dava crises e eu começava a chorar, depois me arrependia e chorava compulsivamente, como se fosse uma montanha russa, um quadro de emoções que você muda toda hora".
São várias as teorias médicas à cerca do que pode ser a causa da TDPM, mas nenhuma chegou a uma conclusão completamente acertada. Nenhum estudo confirmou que os hormônios sejam a razão para o transtorno, mas o consenso é de que a causa seria a própria ovulação em si a desencadeadora dos eventos relacionados à TDPM no sistema nervoso central e em outros tecidos. Outras evidências apontam para a serotonina como um importante fator, assim como a elevação de temperatura corporal durante o ciclo menstrual.
A última notícia de que se tem conhecimento é de que pesquisadores do Instituto Nacional de Saúde dos Estados Unidos descobriram mecanismos moleculares que podem estar por trás da TDPM. Segundo a pesquisa o transtorno é causado por um grupo de genes presentes nas mulheres que sofrem com os sintomas, que afeta o modo como os hormônios sexuais interagem com outros genes. "Este é um grande momento para as mulheres, porque demonstra que aquelas afetadas pelo Transtorno Disfórico Pré-Menstrual têm uma diferença intrínseca em seu aparelho molecular em resposta aos hormônios sexuais", afirma o cientista David Goldman, um dos autores da pesquisa em entrevista ao O Globo. Os cientistas afirmam que pela primeira vez existem evidências e uma causa biológica plausível para a TDPM.